A Idolatria e o segundo mandamento: Por que Deus não quer ser retratado?

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Segundo mandamento – “Não faça para si espécie alguma de ídolo ou imagem de qualquer coisa no céu, na terra ou no mar. Não se curve diante deles nem os adore, pois eu, o Senhor, seu Deus, sou um Deus zeloso. Trago as consequências do pecado dos pais sobre os filhos até a terceira e quarta geração dos que me rejeitam, mas demonstro amor por até mil gerações dos que me amam e obedecem a meus mandamentos.” Êxodo 20.4-6.

“Não farás para ti imagem de escultura…” O mandamento é claro, mas por quê? Não seria mais fácil adorar a Deus se pudéssemos vê-Lo representado de alguma forma? É exatamente aí que está o perigo. Quando tentamos criar uma imagem de Deus, inevitavelmente O reduzimos a algo menor do que Ele é.

Pense um pouco sobre como os antigos povos pagãos pensavam. Eles não eram necessariamente tolos que acreditavam que um pedaço de madeira ou pedra era literalmente um deus. Era mais sutil que isso. Eles viam suas imagens como “pontos de contato” com o divino, como se precisassem de algo tangível para se conectar com o espiritual.

Mas Deus diz: “Não é assim que funciona comigo.” Por quê? Porque qualquer imagem que fazemos de Deus inevitavelmente se torna uma caricatura. De modo algum. “Enquanto o primeiro mandamento, condena qualquer forma de adoração a qualquer outro o nosso Senhor, o segundo mandamento se concentra numa questão diferente.”

O Segundo Mandamento: Adorando a Deus Como Ele É, Não Como Queremos Que Ele Seja

O segundo mandamento continua sendo um dos mais mal compreendidos na vida cristã contemporânea. Enquanto a maioria de nós compreende facilmente a proibição contra adorar falsos deuses estabelecida no primeiro mandamento, o segundo traz uma sutileza que frequentemente nos escapa: a proibição de adorar o Deus verdadeiro através de imagens.

A Distinção Crucial

“Não farás para ti imagem de escultura…” – Êxodo 20:4. Esta ordem divina não é redundante em relação ao primeiro mandamento, mas aborda um problema diferente e igualmente perigoso. “O primeiro mandamento proíbe adorar qualquer outro além do Deus vivo; o segundo proíbe adorá-lo de maneira incorreta.”

O episódio do bezerro de ouro em Êxodo 32 ilustra perfeitamente esta distinção. Quando Arão fabricou o ídolo, ele não estava introduzindo uma divindade estrangeira. Pelo contrário, proclamou: “Amanhã, será festa ao SENHOR” – Êxodo 32:5. Arão não estava substituindo Javé por outro deus, mas tentando representar o Deus verdadeiro através de uma imagem tangível – violando assim o segundo mandamento, não o primeiro.

Como observa João Calvino em suas Institutas: “A majestade de Deus é corrompida por uma mentira impudente sempre que lhe é atribuída qualquer forma” – Livro I, XI, 1. A proibição existe porque, como explica Bavinck, “Deus não pode ser representado de maneira visível porque Ele é o Totalmente Outro, transcendente a toda a natureza criada” – Dogmática Reformada, Vol. 2, p.96.

A Idolatria Contemporânea

Nossa tendência moderna é imaginar que superamos a idolatria por não nos curvarmos diante de estátuas. Mas seria ingenuidade pensar que o segundo mandamento não se aplica mais a nós. Como Tim Keller sabiamente observa: “Um ídolo é qualquer coisa que absorva sua imaginação e sua paixão mais do que Deus” – Deuses Falsos, p.17.

Violamos o segundo mandamento quando buscamos adorar o Deus verdadeiro através de imagens – incluindo as que fabricamos em nossa mente. Packer enfatiza: “As imagens desonram a Deus, pois obscurecem sua glória… não podem representar os atributos pessoais de Deus – sua justiça, santidade, sabedoria, etc.” – Conhecendo a Deus, p.40.

Como Sproul inteligentemente observa: “O ídolo mais dominante do mundo moderno é o deus que abençoa nossos desejos em vez de confrontá-los” – O Caráter de Deus, p.72. E não surpreende que o molde para este “ídolo” seja, invariavelmente, nós mesmos. Como notou C.S. Lewis: “O que nós adoramos certamente nos moldará. Nós tendemos a nos tornar como aquilo que adoramos. Se adorarmos algo feito à nossa imagem, nos tornaremos ainda mais conformados a nós mesmos – um ciclo infinito de autoafirmação” – A Abolição do Homem, p.83. Como Tozer advertiu: “O que vier à mente quando pensamos em Deus é a coisa mais importante sobre nós” – O Conhecimento do Santo, p.1.

O Chamado à Adoração Verdadeira

O segundo mandamento nos ordena adorar a Deus como Ele é, não como gostaríamos que fosse. Como expressa John Stott: “Deus se revelou, mas não nos deu permissão para fabricá-lo conforme nossa preferência” – Cristianismo Básico, p.162. Este mandamento nos direciona a uma adoração baseada na verdade revelada, não em preferências pessoais. É um chamado para nos curvarmos diante do Deus que existe, não do deus que desejaríamos.

Precisamos permitir que Deus seja Deus, aceitando Sua autoridade para definir-Se e determinar como deve ser adorado. O conselho dado por um sábio professor a seu jovem aluno seminarista ainda ecoa verdadeiro: “Seu dever é crer e pregar o que a Bíblia diz, não o que você gostaria que ela dissesse”. Esta é a essência do segundo mandamento: adorar a Deus em Seus próprios termos.

Somente Cristo!

Pr. Reginaldo Soares.

Referências Bibliográficas

  1. Bavinck, Herman. Dogmática Reformada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012.
  2. Berkhof, Louis. Teologia Sistemática. São Paulo: Cultura Cristã, 2007.
  3. Calvin, João. As Institutas da Religião Cristã. São Paulo: Cultura Cristã, 2006.
  4. Edwards, Jonathan. Obras. São Paulo: Shedd Publicações, 2018.
  5. Keller, Timothy. Deuses Falsos. São Paulo: Vida Nova, 2016.
  6. Lewis, C.S. A Abolição do Homem. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
  7. Packer, J.I. Conhecendo a Deus. São Paulo: Mundo Cristão, 2010.
  8. Sproul, R.C. O Caráter de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2013.
  9. Stott, John. Cristianismo Básico. São Paulo: Vida Nova, 2007.
  10. Tozer, A.W. O Conhecimento do Santo. São Paulo: Mundo Cristão, 2015.

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