Transformação e Renovação à Luz da Graça
A identidade cristã é forjada através do processo contínuo de transformação espiritual, não através de esforços superficiais. O discipulado intencional cria a comunidade necessária onde nossa identidade cristã é forjada à semelhança de Cristo.
A Batalha pela Identidade Autêntica

“Eu não sou quem eu gostaria de ser, eu não sou quem eu poderia ser, eu não sou quem eu deveria ser, mas graças a Deus eu não sou mais quem eu era.” Estas palavras de Martin Luther King Jr. capturam a essência da transformação cristã – um processo contínuo que redefine quem somos à luz da graça salvadora de Cristo. Em um mundo obcecado com identidades superficiais e passageiras, o cristão é chamado a uma identidade forjada nas profundezas do caráter, moldada pelo relacionamento com Deus. O filme “A Forja” nos oferece uma poderosa parábola visual deste processo de transformação espiritual que remodela nossa identidade em Cristo.
Neste artigo, exploraremos os elementos fundamentais da formação da identidade cristã, examinando como confissão, oração, compromisso e discipulado podem nos transformar radicalmente, assim como transformaram o protagonista Isaías. Ao final, você compreenderá não apenas o que significa ter uma identidade moldada por Cristo, mas também como esse processo pode ser vivido diariamente.
A Identidade Cristã: Forjada na Semelhança de Cristo
O Caráter como Fundamento da Identidade Cristã
No filme “A Forja”, vemos um jovem de 19 anos, Isaías, cuja vida é completamente transformada por três perguntas fundamentais: “Em que aspectos você quer crescer?”, “Que tipo de homem você quer ser?” e “O que quer que as pessoas pensem ao lembrarem de você?” Estas perguntas representam um desafio direto à construção de caráter, algo profundamente enraizado na teologia reformada.
Como João Calvino observou em suas Institutas da Religião Cristã: “O primeiro passo para o verdadeiro conhecimento é nos conhecermos a nós mesmos.” Este autoconhecimento, segundo Calvino, não é meramente psicológico, mas teológico – reconhecendo quem somos em relação a Deus. A identidade cristã autêntica começa com esta confrontação honesta.
Em nossa cultura contemporânea, privilegiamos frequentemente a aparência externa sobre o caráter interior. No entanto, como escreveu Herman Bavinck: “A graça restaura a natureza.” Esta restauração divina atinge o âmago de quem somos, reformando nosso caráter à imagem de Cristo, não apenas modificando nossos comportamentos externos.
Da Passividade à Intencionalidade Espiritual
Isaías passa de uma vida marcada pela irresponsabilidade e procrastinação (Ato de adiar ou atrasar uma tarefa, compromisso ou atividade, sabendo que isso pode ter consequências negativas) para uma existência intencional e direcionada. Este movimento da passividade à intencionalidade reflete um princípio essencial da formação da identidade cristã: somos chamados a participar ativamente no processo de nossa transformação.
“Deus não nos salva contra nossa vontade, mas também não nos transforma sem nossa participação.” – R.C. Sproul, um dos grandes teólogos reformados contemporâneos, captura aqui a tensão teológica entre a soberania divina e a responsabilidade humana. A identidade cristã é forjada nesta interseção – onde a graça soberana de Deus encontra nossa obediência voluntária. Não somos meros espectadores de nossa transformação, mas participantes ativos no processo divino de renovação.
Provérbios nos ensina: “O coração do ser humano traça o seu caminho, mas o Senhor lhe dirige os passos.” Esta sabedoria bíblica nos convida a uma vida de planejamento intencional, enquanto mantemos uma humilde dependência da direção divina – exatamente o que vemos na jornada de Isaías.
A Confissão Genuína: O Portal para a Transformação
A Entrega Total
A transformação de Isaías começa com uma confissão autêntica de Cristo como Senhor de sua vida. Esta confissão não é meramente verbal, mas existencial – manifestando-se em decisões concretas como renunciar ao videogame, reordenar suas prioridades e, crucialmente, perdoar seu pai ausente. Jonathan Edwards, em sua obra “Afetos Religiosos”, argumenta que a verdadeira conversão sempre produz evidências visíveis: “Afetos religiosos genuínos manifestam-se em prática cristã.” Quando Cristo é verdadeiramente confessado como Senhor, toda a vida é reorientada em torno dEle.
Para o cristão contemporâneo, isso levanta uma questão desafiadora: Há áreas em nossa vida onde ainda resistimos à senhoria de Cristo? A confissão genuína de fé não é compatível com a compartimentalização espiritual – ela exige uma transformação integral.
O Preço da Cruz: Renúncias e Recompensas

O filme apresenta com clareza que, embora a salvação seja gratuita, o discipulado tem um custo. Isaías enfrenta decisões difíceis e renúncias significativas em sua jornada de transformação. Dietrich Bonhoeffer, em seu clássico “Discipulado”, nos lembra: “Quando Cristo chama um homem, ele o convida a vir e morrer.”
Esta morte metafórica – para o ego, para ambições mundanas, para ressentimentos alimentados – é precisamente o que vemos em Isaías. Ele deve morrer para sua antiga identidade para que uma nova possa emergir. “E, assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas.” 2 Coríntios 5:17.
A tradição reformada sempre destacou que seguir a Cristo significa mais do que crer nele – é viver conforme seu exemplo. Como afirma John Piper, “A cruz não é apenas o lugar onde a justiça de Deus é satisfeita, mas também o padrão para nossa própria vida.” Isso significa que a cruz não é apenas um evento do passado, mas uma realidade presente na vida do cristão. Ao nos identificarmos com Cristo, tomamos parte em sua morte e ressurreição: morremos diariamente para o pecado, renunciando aos nossos desejos egoístas, e ressuscitamos para uma nova vida, guiada pelo Espírito. Esse processo contínuo de transformação é o verdadeiro discipulado – não apenas reconhecer o sacrifício de Cristo, mas vivê-lo em obediência e santidade, confiando que, assim como Ele venceu a morte, também seremos plenamente restaurados nele.
A Oração Transformadora: Do Estepe ao Volante
Cultivando Dependência Constante
Um dos ensinamentos mais poderosos do filme vem através da personagem Clara, que afirma que não devemos tratar a oração como um “estepe” para emergências, mas como um “volante” que guia nossa jornada diária. Esta metáfora captura uma verdade teológica profunda sobre a natureza da oração na vida cristã.
Como escreveu Abraham Kuyper: “A oração não é um meio pelo qual forçamos Deus a fazer nossa vontade, mas o meio pelo qual somos transformados para fazer a Sua vontade.” Muitas vezes, nos aproximamos de Deus como se a oração fosse apenas um mecanismo para conseguirmos uma interminável lista de bênçãos, mas seu propósito principal é nos alinhar com o caráter e os planos do Pai. Quando oramos, não apenas apresentamos nossas necessidades, mas somos transformados à luz de Sua presença, aprendendo a confiar em Sua sabedoria e a desejar aquilo que Ele deseja. A verdadeira oração não busca manipular Deus, mas nos leva a uma vida de rendição, onde nossa fé cresce e nossa comunhão com Ele se aprofunda, permitindo que sejamos conformados à imagem de Cristo.

O filme demonstra esta verdade através do contraste entre a oração comunitária do grupo de homens e a intercessão persistente da mãe de Isaías. Ambas as formas de oração são essenciais para a formação da identidade cristã – a primeira nos conecta com a comunidade de fé, enquanto a segunda expressa uma dependência individual e contínua de Deus.
Batalha Espiritual e Renovação Mental
A oração de Isaías é retratada como uma genuína batalha espiritual contra seus próprios impulsos e desejos. Esta dimensão combativa da oração reflete o entendimento paulino de renovação da mente: “E não vivam conforme os padrões deste mundo, mas deixem que Deus os transforme pela renovação da mente, para que possam experimentar qual é a boa, agradável e perfeita vontade de Deus. – Romanos 12:2.
Tim Keller observa: “A oração é o meio principal pelo qual nossos pensamentos são alinhados com a realidade de Deus.” Quando oramos, não estamos apenas comunicando com Deus, mas permitindo que Sua verdade transforme nossa percepção da realidade.
No mundo atual, onde tantas vozes disputam nossa atenção com a clara intenção de moldar nossa identidade, a oração transformadora se torna essencial para o cristão cultivar uma cosmovisão centrada em Deus. Em meio a narrativas culturais que redefinem valores e confundem o significado da existência, a oração nos ancora na verdade divina, permitindo-nos enxergar a realidade não pelas distorções do relativismo, mas pela luz imutável das Escrituras. Quando buscamos a Deus em oração, nosso coração é reorientado, nossos pensamentos são renovados e nossos afetos são moldados pelo Espírito Santo. Assim, passamos a discernir o que realmente importa e encontramos segurança na identidade que temos em Cristo, não na aprovação do mundo. Dessa forma, a oração não apenas nos fortalece espiritualmente, mas também nos equipa para viver e testemunhar a verdade em um tempo de incertezas.
O Discipulado Intencional: A Comunidade que Forja
O relacionamento entre Josué e Isaías no filme exemplifica o poder transformador de um discipulador cristão, na vida de quem está iniciando na fé. Josué não apenas transmite conhecimento teológico, mas modela uma vida transformada pela graça – incluindo sua própria jornada de perdão radical (Não queremos dar spoiler do filme).
Edmund Clowney, em sua obra sobre eclesiologia reformada, enfatiza: “A igreja é o lugar onde o futuro de Deus invade o presente.” Esta invasão acontece principalmente através de relacionamentos de discipulado intencional, onde os mais maduros na fé conduzem os mais jovens em direção à semelhança de Cristo.
O modelo de discipulado apresentado no filme – orgânico, intencional e comunitário – oferece um corretivo importante à tendência contemporânea de individualismo espiritual ou de modelos de espiritualidade de massa onde a pouco ou nenhum pastoreio. Nossa identidade cristã é forjada não em isolamento, mas na caminhada comunitária com nossos irmãos.
A Identidade em Processo
A transformação de Isaías não é instantânea, mas processual – uma jornada contínua de formação e restauração. Da mesma forma, nossa identidade cristã está sempre em desenvolvimento, sendo forjada nas experiências diárias de confissão, oração, compromisso e discipulado.
Como expressa a Confissão de Westminster: “Somos santificados completa e perfeitamente no homem interior, contudo imperfeitamente nesta vida.” Esta tensão entre o “já” e o “ainda não” da nossa identidade cristã nos mantém dependentes da graça e comprometidos com o crescimento contínuo.
O filme “A Forja” nos convida a examinar nossas próprias vidas e perguntar: Estamos permitindo que nossa identidade seja verdadeiramente forjada por Cristo? Estamos cultivando as disciplinas espirituais que facilitam essa transformação? Estamos nos submetendo ao processo frequentemente doloroso, mas em última instância libertador, de sermos moldados à imagem de Cristo?
Somente Cristo! Pr. Reginaldo Soares.

Meu chamado para o ministério pastoral veio em 1994, sendo encaminhado ao conselho da Igreja Presbiteriana (IPB) em Queimados e em seguida ao Presbitério de Queimados (PRQM). Iniciei meus estudos no ano seguinte, concluindo-os em 1999. A ordenação para o ministério pastoral veio em 25 de junho de 2000, quando assumi pastoreio na IPB Inconfidência (2000-2003) e da IPB Austin (2002-2003). Desde de 2004 tenho servido como pastor na Igreja Presbiteriana em Engenheiro Pedreira (IPEP), onde sigo conduzido esse amado rebanho pela graça de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Sou casado há 22 anos com Alexsandra, minha querida esposa, sou pai de Lisandra e Samantha, preciosas bênçãos de Deus em nossas vidas. Me formei no Seminário Teológico Presbiteriano Ashbel Green Simonton, no Rio de Janeiro, e consegui posteriormente a validação acadêmica pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pela bondade de nosso Senhor, seguimos compartilhando fé, amor e buscando a cada dia crescimento espiritual. Somente Cristo!