THE LAST OF US
Você já parou para contemplar como os símbolos mais sagrados podem ser redirecionados para propósitos tão distantes de sua intenção original? Imagine-se caminhando pelas ruas devastadas de Seattle com Ellie e Dina em The Last of US, duas jovens peregrinas em um mundo despedaçado, enquanto elas observam, com olhos inocentes, as bandeiras do arco-íris penduradas entre os escombros: “Talvez eles sejam só esperançosos”.
Que extraordinária ironia! O arco-íris — aquele majestoso sinal da aliança divina após o dilúvio, aquela promessa pintada nos céus pela mão do próprio Criador — agora tremula como estandarte de uma visão de humanidade que contradiz o propósito original de seu Autor. Como escreveu Agostinho: “Amas, mas não sabes o que amas; crês, mas não sabes em quê crês; esperas, mas não sabes o que esperas.” As personagens veem esperança onde, talvez, haja apenas a sombra distorcida dela.
Esta cena de The Last of US nos apresenta, em miniatura, o dilema que enfrentamos como seguidores de Cristo em um mundo que não apenas rejeitou a visão bíblica da sexualidade, mas transformou tal rejeição em sua própria narrativa de redenção. Nosso desafio não é meramente intelectual, mas também um desafio ao coração.
A música nos escombros
Pensemos agora naquele momento de beleza inesperada em meio às ruínas: Ellie encontra um violão em uma loja abandonada e seus dedos começam a dedilhar “Take On Me”. A melodia que uma vez a conectava ao pai adotivo assassinado agora se torna a ponte para um novo tipo de relacionamento. Consegue perceber a sutileza deste movimento narrativo?
“Estamos jogando conversa fora
Eu não sei o que vou dizer
Eu direi mesmo assim
Hoje é outro dia para te encontrar
Me evitando
Eu voltarei para buscar o seu amor, tá bom?Me dê uma chance (me dê uma chance)
Me aceite (me dê uma chance)Aprendendo aos poucos que a vida é boa
É melhor se arriscar do que se arrependerMe dê uma chance (me dê uma chance)
Me aceite (me dê uma chance)Você é tudo de que eu preciso me lembrar”
A canção fala, não é mesmo? Como Lewis nos lembraria, com um sorriso irônico: “Pensamos estar fazendo as músicas; é a música que nos faz.” A narrativa usa esta transição musical para conduzir o espectador a uma conclusão emocional antes que sua mente tenha chance de refletir criticamente.
O violão — instrumento cuja própria forma ecoa o corpo humano — move-se de símbolo da paternidade para símbolo do desejo romântico homossexual. É uma metamorfose sutil, quase imperceptível, como aquelas pequenas concessões que fazemos ao espírito da época sem perceber que estamos sendo remodelados.
Quando os peregrinos perdem o mapa
A história de Bella Ramsey, a atriz que interpreta Ellie, desdobra-se como uma parábola dolorosa que corre em paralelo à narrativa da série. Em 2018 essas foram as palavras de Bella Ramsey no dia e seu batismo: “Minha fé é uma parte tão importante da minha vida. Estou pronta para ser imersa e dizer publicamente que Jesus é o meu salvador.”
No entanto, em 2023, em entrevista ao The New York Times, Bella afirmou que sua relação com a fé estava “muito mais quieta”. Atualmente, ela se identifica como pessoa de gênero fluido e parte da comunidade LGBTQ+. Os vídeos em que tocava músicas cristãs foram removidos, numa aparente tentativa de desvincular seu passado de seu presente.
Este paralelo entre a personagem e a atriz ilustra uma realidade dolorosa: o caminho de apostasia que muitos jovens criados na fé cristã têm seguido diante das pressões culturais contemporâneas. Na série, o violão representa a conexão perdida com Joel; na vida real, simboliza uma conexão com Deus que se esvaiu.
Não é esta a jornada terrível que muitos de nossos jovens têm trilhado? Começam com passos firmes pela estrada estreita, mas logo são seduzidos pelas avenidas iluminadas do mundo que prometem liberdade, autenticidade e aceitação. Como aquele filho pródigo, trocam a mesa do pai pelo cocho dos porcos, iludidos pelo brilho momentâneo do que parece ser libertação.
Ah, como nos falta a fervorosa urgência de Lloyd-Jones para gritar aos nossos jovens: “Vocês estão sendo enganados! Estão trocando o ouro eterno por bugigangas passageiras! Estão abandonando Aquele que é o Pão da Vida para se alimentarem de cinzas!”
E ainda assim — e aqui precisamos da terna compaixão pastoral de Peterson — estes jovens não são inimigos a serem derrotados, mas ovelhas perdidas a serem resgatadas. Quantos deles foram empurrados para fora do rebanho por pastores que usaram o cajado para golpear em vez de guiar?
A travessia da corda bamba
“A maneira como você pensa sobre qualquer coisa depende do que você ama”, diria Lewis. E aqui está nosso enigma mais profundo: como amar verdadeiramente sem comprometer a verdade? Como permanecer firmes nas convicções bíblicas sobre sexualidade enquanto demonstramos amor autêntico às pessoas que se identificam como LGBTQ+?
Muitos cristãos têm tropeçado para um lado ou para outro desta corda bamba espiritual. De um lado, caem na vala do legalismo hostil, esquecendo-se que também foram resgatados pela graça inefável, condenando com pedras nas mãos como se nunca tivessem pecado. Do outro lado, precipitam-se no abismo do sentimentalismo, abandonando a verdade bíblica no altar da aceitação cultural, como se o amor pudesse existir sem a verdade que o estrutura e direciona.
Imaginemos Jesus no episódio da mulher adúltera. Ele não a condena, mas tampouco normaliza seu comportamento: “Eu não te condeno; vai e não peques mais.” Que equilíbrio magnífico! Que sabedoria divina! Proteção contra os acusadores, mas também um chamado claro ao arrependimento e à transformação. O coração do pai se estende em misericórdia sem jamais comprometer sua santidade.
O Evangelho não é “Me Aceite”
A estratégia narrativa de The Last of US é meticulosamente planejada para normalizar relacionamentos que as Escrituras identificam como contrários ao desígnio divino. As bandeiras reinterpretadas como símbolos de esperança; a música que cria pontes emocionais; a fotografia cuidadosamente composta — tudo trabalha em conjunto para desarmar nossa capacidade crítica e nos convidar a um mundo onde o desejo pessoal é o árbitro final do bem.
Contrastemos isso com a mensagem do Evangelho. Cristo não diz simplesmente “me aceite como eu sou” (take on me), mas “vinde a mim… e eu vos aliviarei.” Sua aceitação é precedida por um chamado ao arrependimento e seguida pela promessa de transformação. Este é o coração pulsante da fé cristã: não somos aceitos para permanecer os mesmos, mas para sermos transformados à imagem dAquele que nos chamou. O hino antigo ecoa esta verdade com poder:
Tal como sou, sem nada apresentar,
Senão o sangue derramado por mim,
E tua voz que chama a me entregar,
Ó Cordeiro de Deus, eu venho a Ti.
Somos recebidos tal como somos, mas não para permanecermos tal como somos. Que diferença profunda entre a mensagem do mundo e a mensagem da cruz!
Andando contra a corrente
Queridos irmãos e irmãs em Cristo, o caminho à nossa frente não será fácil. Em um mundo pós-apocalíptico — não pela infecção fúngica de The Last of US, mas pela erosão sistemática dos fundamentos morais judáico-cristãos — seremos cada vez mais pressionados a escolher: a aprovação do mundo ou a fidelidade ao Senhor.
O apóstolo Pedro, aquele pescador impetuoso transformado pelo Espírito, nos exorta: “Santificai ao Senhor Deus em vossos corações; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós” (1 Pedro 3:15). Observem o equilíbrio perfeito: firmeza na verdade (“santificai ao Senhor”) e gentileza na apresentação (“com mansidão e temor”).
Não somos chamados a conquistar a cultura pela força, nem a capitular diante de suas exigências. Somos chamados a viver como embaixadores de um Reino que não é deste mundo, oferecendo a verdadeira esperança — não aquela dos estandartes coloridos entre os escombros de Seattle, mas a esperança viva que vem da ressurreição de Jesus Cristo. Permitam-me concluir com as palavras do hino de Isaac Watts que continua a ecoar através dos séculos:
Quando contemplo a maravilhosa cruz
Em que o Príncipe da Glória morreu,
Considero meus maiores ganhos como perdas
E lanço meu orgulho aos Seus pés.
Como cristãos devem interagir com pessoas LGBTQ+?
Cristãos devem interagir com pessoas LGBTQ+ da mesma forma que Jesus interagia com todos: com amor, respeito e dignidade. Isto significa construir relacionamentos genuínos, ouvir suas histórias, defender seus direitos civis e protegê-los de violência ou discriminação injusta. Contudo, esta postura amorosa não significa abandonar as convicções bíblicas sobre sexualidade.
É possível amar alguém enquanto se discorda de seu estilo de vida?
Absolutamente. O amor verdadeiro não significa concordância irrestrita. Pais amam seus filhos mesmo quando discordam de suas escolhas. Da mesma forma, podemos amar sinceramente pessoas LGBTQ+ enquanto mantemos nossas convicções bíblicas. O amor cristão busca o bem genuíno do outro conforme definido por Deus, não necessariamente o que o outro define como seu bem.
Por que a igreja não pode simplesmente atualizar sua visão sobre sexualidade para se alinhar à cultura contemporânea?
A igreja fundamenta suas convicções nas Escrituras, não nas tendências culturais. A compreensão cristã de sexualidade não é arbitrária ou antiquada, mas baseada na revelação de Deus sobre o design e propósito do ser humano. Quando a igreja abandona princípios bíblicos para se acomodar à cultura, ela perde sua distinção e missão profética de representar o Reino de Deus neste mundo.
Que possamos, como Ellie com seu violão nas ruínas, fazer música no deserto deste mundo — não música que normaliza o que Deus condena, mas música que eleva os corações para Aquele que, em amor perfeito, entregou-se por nós para que pudéssemos ser verdadeiramente livres.
Neste mundo pós-apocalíptico de valores invertidos, sejamos portadores do verdadeiro arco-íris de esperança: o evangelho de Jesus Cristo, que ama o pecador o suficiente para não deixá-lo como está, mas para convidá-lo a uma nova vida de obediência alegre e transformação contínua.
Somente Cristo! Pr. Reginaldo Soares.
Leia também:
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- A PAIXÃO DE CRISTO: OBRA-PRIMA TEOLÓGICA
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Meu chamado para o ministério pastoral veio em 1994, sendo encaminhado ao conselho da Igreja Presbiteriana (IPB) em Queimados e em seguida ao Presbitério de Queimados (PRQM). Iniciei meus estudos no ano seguinte, concluindo-os em 1999. A ordenação para o ministério pastoral veio em 25 de junho de 2000, quando assumi pastoreio na IPB Inconfidência (2000-2003) e da IPB Austin (2002-2003). Desde de 2004 tenho servido como pastor na Igreja Presbiteriana em Engenheiro Pedreira (IPEP), onde sigo conduzido esse amado rebanho pela graça de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Sou casado há 22 anos com Alexsandra, minha querida esposa, sou pai de Lisandra e Samantha, preciosas bênçãos de Deus em nossas vidas. Me formei no Seminário Teológico Presbiteriano Ashbel Green Simonton, no Rio de Janeiro, e consegui posteriormente a validação acadêmica pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pela bondade de nosso Senhor, seguimos compartilhando fé, amor e buscando a cada dia crescimento espiritual. Somente Cristo!
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