Uma chama para incendiar o mundo com o Evangelho.
Quando pensamos na Inglaterra do século XVIII, com suas ruas enlameadas e sua sociedade marcada por profundas divisões sociais, emerge a figura transformadora de John Wesley (1703-1791), um homem cujo legado transcendeu seu tempo e continua a influenciar o cristianismo moderno.
A paixão por Deus de John Wesley mexeu profundamente com a vida espiritual dos ingleses e com a estrutura social de seu país. Nascido em Epworth, Lincolnshire, Wesley teve uma infância marcante. Aos 7 anos, sobreviveu milagrosamente a um incêndio, resgatado por um vizinho através da janela. Sua mãe, Susanna Wesley, frequentemente o lembrava deste evento, dizendo que ele era “um tição colhido do fogo”, citando Zacarias 3:2. Mais tarde, Wesley teve a certeza de que havia sido poupado com o propósito de servir a Deus.
Seu pai, Samuel, era um erudito que trabalhou por muitos anos em uma obra monumental sobre o livro de Jó. Era um pregador severo, para não dizer implacável – certa vez exigiu que uma adúltera andasse pelas ruas expondo sua vergonha. Também forçou o casamento de uma de suas filhas após ela tentar fugir com um homem que não era o escolhido por ele. Com seus pais, John Wesley desenvolveu excelentes hábitos de estudo e também se acostumou com o sofrimento físico.
A formação de John Wesley
A formação acadêmica de John Wesley foi rigorosa. Estudou na Charterhouse School em 1714 e depois no Christ Church College em 1720, em Oxford, onde se destacou como estudante e, posteriormente, como professor. Embora muitos jovens brilhantes tivessem um currículo como o de John Wesley, poucos tinham sua dedicação. Dominava pelo menos sete idiomas e desenvolveu uma visão verdadeiramente abrangente em todas as áreas do conhecimento. Foi em Oxford que, junto com seu irmão Charles e outros estudantes, formou o “Clube Santo” – cujos membros foram pejorativamente chamados de “metodistas” devido a seus métodos rigorosos de disciplina espiritual.
O Clube Santo fazia muito mais que refletir e orar – seus membros visitavam prisões para levar a palavra de salvação aos prisioneiros. Embora fossem ridicularizados por seus companheiros de Oxford, deste grupo de uma classe social mais baixa saíram homens que se tornaram importantes para aquela época, particularmente os irmãos Wesley e o famoso George Whitefield.

Em 1735, grandes mudanças ocorreram na vida dos irmãos Wesley. Após a morte de seu pai, ambos partiram para a colônia da Geórgia, nos Estados Unidos, com a bênção e encorajamento de sua mãe. Esta experiência foi reveladora para John Wesley, que percebeu não ter muita afinidade com os índios, e sua rigidez não era bem recebida pelos colonos. Mais significativo foi seu contato durante a viagem com um pequeno grupo de morávios, que impressionaram Wesley com sua fé inabalável ao cantarem hinos durante uma terrível tempestade marítima, enquanto ele próprio se desesperava.
Em 1737, Wesley retornou à Inglaterra. Sua humildade permitiu-lhe ser crítico consigo mesmo, reconhecendo sua falta de fé apesar de sua experiência ministerial. Peter Boehler, um morávio, aconselhou-o a “pregar a fé até que a tivesse”. Wesley lutou com sua falta de fé até 24 de maio de 1738, quando teve uma profunda e inconfundível experiência de conversão no famoso encontro de Aldersgate”. Wesley descreveu em seu diário como, durante a leitura do prefácio de Lutero à Epístola aos Romanos, sentiu seu coração “estranhamente aquecido” e recebeu a certeza da salvação pela fé em Cristo. Esta experiência marcou o início de seu ministério.
Com uma mente brilhante, Wesley conseguiu extrair os melhores recursos das melhores mentes de seu tempo. William Law, por exemplo, foi seu professor e amigo por vários anos, mas Wesley percebeu que faltava um ingrediente importante no programa de Law para uma vida devota. Os discípulos de Platão forneceram-lhe uma estrutura intelectual mais espiritual que material, mas seus hábitos mentais estavam mais alinhados com o modelo de análise de Newton. Os morávios aproximavam-se mais de uma síntese de todos os elementos que ele desejava, embora em 1740 ele e seus seguidores tenham se separado deles.
Um ministério poderoso

Aos 37 anos, Wesley começou sua jornada de pregação itinerante. Pregava três vezes ao dia, começando às 5 da manhã, quando os trabalhadores podiam ouvi-lo a caminho do trabalho. Frequentemente percorria 60 milhas (mais de 90 km) por dia a cavalo, independentemente das condições climáticas. Sua determinação era notável – certa vez, fugindo de uma multidão hostil, pulou em um lago gelado, nadou para a outra margem e continuou pregando.
Impedido de pregar em muitas igrejas anglicanas devido a suas posições consideradas radicais, Wesley adotou a prática revolucionária de pregar ao ar livre, seguindo o exemplo de George Whitefield. Montado em seu cavalo, percorreu cerca de 250.000 milhas através da Inglaterra, pregando aproximadamente 40.000 sermões durante sua vida. Entre 1741 e 1751, Wesley expandiu seu ministério para Gales do Sul, norte da Inglaterra, Irlanda e Escócia. Ao longo de sua vida, visitou a Irlanda 42 vezes e a Escócia 22 vezes.
John Wesley desenvolveu um sistema único de disciplina e organização eclesiástica. Criou as “sociedades” metodistas, subdivididas em “classes” menores, onde os membros se encontravam semanalmente para prestação de contas mútua, oração e estudo bíblico. Este sistema de discipulado em pequenos grupos tornou-se um modelo que influencia igrejas até hoje.
Sua teologia era distintivamente wesleyana – enfatizava tanto a necessidade da graça divina quanto a responsabilidade humana, tanto a justificação pela fé quanto a santificação progressiva. Seu conceito de “perfeição cristã” – não como ausência de erro, mas como amor perfeito a Deus e ao próximo – tornou-se uma marca distintiva do metodismo.
John Wesley foi também um reformador social. Opôs-se veementemente à escravidão, estabeleceu clínicas gratuitas para os pobres, criou programas de empréstimo para pequenos empreendedores e publicou literatura acessível para educação popular. Sua visão de que não há santidade bíblica que não seja santidade social influenciou gerações de reformadores cristãos.
Apesar de nunca ter pretendido fundar uma nova denominação, permanecendo anglicano até sua morte, o movimento metodista cresceu enormemente sob sua liderança. Quando faleceu em 1791, havia cerca de 79.000 metodistas na Grã-Bretanha e 40.000 na América do Norte.
O legado de Wesley é multifacetado. Suas contribuições incluem:
– A ênfase na experiência pessoal com Deus, sem negligenciar a importância da razão e da tradição
– O desenvolvimento de um sistema eficaz de discipulado em pequenos grupos
– A integração entre evangelismo e ação social
– A valorização tanto da piedade pessoal quanto da responsabilidade social
– O uso inovador de leigos no ministério, incluindo mulheres pregadoras
– A produção de uma vasta literatura teológica acessível ao povo comum
John Wesley exemplificou uma rara combinação de zelo evangelístico, rigor teológico e preocupação social. Sua vida demonstrou que avivamento espiritual genuíno produz não apenas conversões individuais, mas também transformação social.
Hoje, o metodismo que ele fundou cresceu para mais de 80 milhões de seguidores em todo o mundo. Mas seu impacto vai muito além dos limites denominacionais. Seus percepções sobre discipulado, santificação e reforma social continuam relevantes para a igreja contemporânea.

John Wesley nos lembra que o cristianismo autêntico combina cabeça e coração, fé e obras, piedade pessoal e responsabilidade social. Em uma época de polarizações, sua síntese equilibrada oferece um modelo valioso para a igreja atual. Como ele mesmo escreveu em seu leito de morte: “O melhor de tudo é que Deus está conosco” – uma verdade que continua a inspirar cristãos em todo o mundo. John Wesley faleceu em Londres, Inglaterra, no dia 02 de março de 1791.
Frases de John Wesley
As palavras de Wesley frequentemente capturavam verdades profundas com notável clareza e força. Algumas de suas declarações mais significativas incluem:
Sobre Santidade e Amor:
“Faça todo o bem que puder, por todos os meios que puder, de todas as maneiras que puder, em todos os lugares que puder, em todos os momentos que puder, para todas as pessoas que puder, enquanto puder.”
Sobre Dinheiro e Mordomia:
“Ganhe o máximo que puder, economize o máximo que puder, doe o máximo que puder.” Esta tripla máxima resumia sua visão de mordomia cristã.
Sobre a Vida Cristã:
“O mundo é minha paróquia” – uma declaração que refletia sua visão de ministério sem fronteiras.
“Acenda fogo em seu coração e as pessoas virão para ver você queimar.”
Sobre Santificação:
“Sem santidade, ninguém verá o Senhor; mas eu devo crer que a santificação é tanto gradual quanto instantânea.”
Sobre a Bíblia:
“Sou um homem de um só livro” – expressando sua devoção às Escrituras como fundamento de fé e prática.
Sobre Experiência Espiritual:
“Senti meu coração estranhamente aquecido” – sua famosa descrição da experiência em Aldersgate.
Sobre Reforma Social:
“A religião deve necessariamente produzir tanto a laboriosidade quanto a frugalidade, e estas não podem senão produzir riqueza.”
Em Seu Leito de Morte:
“O melhor de tudo é que Deus está conosco.” Esta seria sua última e talvez mais memorável declaração.
Uma de suas observações mais penetrantes sobre o declínio espiritual permanece especialmente relevante: “O que devemos temer não é tanto a presença de muçulmanos a nossa volta, mas a ausência de Deus em nosso meio. Não devemos temer que eles possam tomar nossos lugares, mas que Deus nos abandone.”
Estas palavras de Wesley continuam a ecoar através dos séculos, oferecendo sabedoria e orientação para a igreja contemporânea. Elas nos lembram que a verdadeira espiritualidade combina devoção pessoal profunda com compromisso social ativo, sempre fundamentada na graça transformadora de Deus.
Por fim, sua exortação pastoral continua relevante: “Não faça nada que você saiba ser pecado, nem deixe de fazer algo que você saiba ser seu dever.” Esta simplicidade direta em questões de conduta moral exemplifica a clareza e praticidade que caracterizavam seu ministério.
Somente Cristo!
Pr. Reginaldo Soares.
Referências Bibliográficas:
- Heitzenrater, Richard P. “Wesley and the People Called Methodists”. Nashville: Abingdon Press, 2013.
- Collins, Kenneth J. “The Theology of John Wesley: Holy Love and the Shape of Grace”. Nashville: Abingdon Press, 2007.
- Outler, Albert C. (Ed.). “The Works of John Wesley”. Nashville: Abingdon Press, 1984.
- Maddox, Randy L. “Responsible Grace: John Wesley’s Practical Theology”. Nashville: Kingswood Books, 1994.
- Hempton, David. “Methodism: Empire of the Spirit”. Yale University Press, 2005.
- Wood, A. Skevington. “The Burning Heart: John Wesley: Evangelist”. Minneapolis: Bethany House Publishers, 1978.
- Rack, Henry D. “Reasonable Enthusiast: John Wesley and the Rise of Methodism”. London: Epworth Press, 2002.
- Telford, John (Ed.). “The Letters of John Wesley”. London: Epworth Press, 1931.
- Wesley, John. “A Plain Account of Christian Perfection”. Edição anotada por Randy L. Maddox. Nashville: Abingdon Press, 2015.
- Thorsen, Don. “Calvin vs Wesley: Bringing Belief in Line with Practice”. Nashville: Abingdon Press, 2013.
❤️🔥🙌🏻
Olá, Lisandra.
Muito obrigado querida.