“A verdadeira religião não consiste tanto em fazer muitas orações, ouvir muitos sermões, ler muitos livros devotos, ou observar muitas cerimônias, quanto em ter um coração cheio do amor de Deus e do próximo. A religião verdadeira é experimental; ela deve ser sentida no coração. Todas as práticas externas são vãs sem isso.” Jonathan Edwards, Tratado sobre os Afetos Religiosos, p. 156.
1 Pedro 1:16 – “Sede santos, porque eu sou santo.”
Resolução certa
Vivemos numa era de gráficos de progresso e aplicativos de automonitoramento, onde cada passo é contado, cada caloria registrada, cada meta quantificada. Benjamin Franklin, com suas treze virtudes racionais organizadas em tabelas de verificação, seria o guru perfeito de nosso tempo. Mas quando Franklin finalmente desistiu de seu plano de aperfeiçoamento moral – descobrindo que não conseguia manter todas as virtudes simultaneamente – ele revelou a futilidade fundamental de todo projeto de autossalvação.
Jonathan Edwards, contemporâneo de Franklin, também escreveu resoluções – setenta delas. Mas enquanto Franklin buscava tornar-se “um bom cidadão e um empresário de sucesso”, Edwards perseguia algo infinitamente mais perigoso: a santidade de Deus. “Sede santos, porque eu sou santo”, ecoa através dos séculos como um mandamento que simultaneamente inspira e aterroriza.
O que diferencia as resoluções de Edwards não é sua quantidade ou intensidade, mas seu fundamento teológico. Ele “exercitava sua vontade, sabendo que sua vontade estava em cativeiro”. Esta é a tensão que nossa geração perdeu – como pode um homem resolver ser santo sabendo que é pecador? Como pode buscar a perfeição reconhecendo sua total dependência da graça?
“Tudo o que pertence à nossa salvação, seja a chamada eficaz, a justificação, a santificação ou a glorificação, tem sua fonte no amor eletivo de Deus, flui inteiramente da graça gratuita e é dado a conhecer apenas por meio da revelação divina. Nada em nós move Deus a nos amar; é o Seu amor que nos move a amá-Lo.” João Calvino, Institutas da Religião Cristã, Livro III, Cap. 2, p. 89.
Os frutos da Salvação
O mandamento de 1 Pedro 1:16 cita diretamente Levítico 11:44, onde Deus ordena a Israel: “Sede santos, porque eu sou santo”. Mas Pedro, escrevendo após a cruz, compreende que esta santidade não é conquista humana, mas participação na natureza divina através de Cristo. A santidade não é imitação externa da bondade divina, mas transformação interna pela união com Cristo.
“A santidade não é uma conquista humana, mas um dom divino. Não é algo que produzimos por nossos esforços, mas algo que recebemos pela fé. Como todas as bênçãos da salvação, a santidade flui da união com Cristo. Estamos unidos a Ele em Sua morte e ressurreição, e essa união nos capacita a viver uma nova vida.” John Murray, Redenção Consumada e Aplicada, p. 167.
Edwards compreendia este paradoxo profundamente. Suas resoluções eram “extenuantes de modo a engajar todo poder, força, vigor e veemência”, mas nasciam de um homem “completamente instruído pela Palavra de Deus e pelo evangelho da salvação pela graça”. Ele não buscava ganhar a salvação através do esforço moral, mas expressar uma salvação já recebida.
Contraste isto com muitos cristãos que caíram na armadilha de prestar “muita atenção a si mesmos”. Quando nos perguntamos “Eu realmente sou salvo?” e vasculhamos nossa vida interior buscando evidências de santidade, revelamos nossa incompreensão fundamental do evangelho. A salvação é fundamentada não em nossa performance, mas na obra objetiva de Cristo.
Edwards exemplificava “a sensibilidade cristã integrada na qual o espírito, o intelecto e as emoções têm o seu lugar”. Ele via significado espiritual na natureza não por deificar a criação, mas por reconhecer nela “uma expressão da personalidade divina”. Seu autoexame não era narcisismo romântico, mas disciplina piedosa que sempre apontava para além de si mesmo.
A diferença é crucial: Franklin fazia “marcas de verificação indicando seu progresso” como se a virtude fosse mercadoria a ser acumulada. Edwards escrevia resoluções como lembretes de sua dependência total de Deus. Um olhava para dentro buscando autossuficiência; o outro olhava para fora reconhecendo sua necessidade de graça e os frutos que ela gera.
Esta distinção ecoa através da história americana. Os “hábitos puritanos” – autodisciplina, ética de trabalho, seriedade moral – “persistiram muito tempo depois do eclipse de sua teologia”, sendo apropriados por secularistas, liberais e materialistas. Mas arrancados de seu fundamento teológico, estes hábitos se tornaram ferramentas de autossalvação, não frutos de salvação recebida.
“Deus não nos chama para sermos santos para que possamos ser Seus filhos, mas porque já somos Seus filhos em Cristo. A santidade é o fruto da justificação, não sua causa. É a evidência da graça, não seu fundamento. É o resultado do amor de Deus por nós, não o meio de conquistá-lo.” Martyn Lloyd-Jones, Estudos no Sermão do Monte, p. 234.
União que gera Santidade
A santidade bíblica é simultaneamente impossível e inevitável – impossível por nossos próprios esforços, inevitável pela obra de Cristo em nós. “Sede santos” não é convite ao desespero, mas chamado à dependência. Não somos chamados a imitar a santidade de Deus do exterior, mas a participar dela através de nossa união com Cristo.
Edwards compreendia que quando “olhamos para dentro de nós, vemos nosso pecado e nossa fraqueza, conduzindo-nos apenas ao desespero. Mas quando olhamos para fora, para as promessas da Palavra de Deus, podemos encontrar alegria, confiança e segurança.” Cristo é tanto a fonte quanto o padrão de nossa santidade.
As resoluções de Edwards não eram exercícios de autoconfiança, mas disciplinas de dependência. Cada resolução o lembrava não do que ele podia fazer, mas do que Deus havia feito. Em Cristo, nossa busca por santidade torna-se não esforço desesperado de alcançar Deus, mas resposta grata ao Deus que nos alcançou.
Como Lutero aconselhava “almas atormentadas a pararem de olhar para si mesmas” e fixarem os olhos “em Cristo na cruz”, descobrimos que a verdadeira santidade cresce não no solo da autoconsciência, mas na terra fértil da consciência de Cristo.
E agora, como viveremos?
Examine suas próprias “resoluções” – sejam formais ou informais. Elas nascem da confiança em sua capacidade ou do reconhecimento de sua necessidade? Quando você falha em suas disciplinas espirituais, olha para dentro buscando mais força de vontade, ou olha para fora, para Cristo na cruz?
Pratique o que Edwards praticava: resolução sem autossuficiência. Estabeleça disciplinas não como meios de ganhar favor divino, mas como respostas à graça já recebida. Quando orar, lembre-se de que sua acesso a Deus não depende da qualidade de sua oração, mas do sangue de Cristo. Quando ler as Escrituras, procure não apenas orientação para viver melhor, mas Cristo revelado em cada página.
Resista à tentação moderna de quantificar sua espiritualidade. Aplicativos podem contar versículos lidos e orações feitas, mas não podem medir a profundidade de sua união com Cristo. A santidade verdadeira é qualitativa, não quantitativa – questão de ser, não de fazer.
Quando se sentir tentado ao desespero espiritual, pratique o conselho de Lutero: pare de olhar para dentro e olhe para fora, para as promessas objetivas da Palavra. Sua segurança espiritual não está na consistência de suas disciplinas, mas na “expiação de Cristo pelos seus pecados”.
Oremos
Pai santo, reconheço que o chamado “sede santos, porque eu sou santo” me revela simultaneamente Tua glória e minha necessidade. Concede-me graça para buscar santidade não como meio de conquistar Teu favor, mas como fruto de Tua graça já derramada sobre mim. Livra-me da obsessão mórbida comigo mesmo que caracteriza nossa era, e ensina-me a olhar para fora, para Cristo na cruz, sempre que a autoconsciência me conduzir ao desespero. Capacita-me a fazer resoluções que reflitam dependência, não autossuficiência; que busquem Tua glória, não minha reputação; que nasçam da gratidão, não do medo. Que minha vida inteira seja uma resolução viva de amar-Te de todo coração, alma, mente e forças – não por minha força, mas por Tua graça. Em nome de Jesus Cristo, minha santidade e minha esperança. Amém.
Somente Cristo! Pr. Reginaldo Soares.
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Meu chamado para o ministério pastoral veio em 1994, sendo encaminhado ao conselho da Igreja Presbiteriana (IPB) em Queimados e em seguida ao Presbitério de Queimados (PRQM). Iniciei meus estudos no ano seguinte, concluindo-os em 1999. A ordenação para o ministério pastoral veio em 25 de junho de 2000, quando assumi pastoreio na IPB Inconfidência (2000-2003) e da IPB Austin (2002-2003). Desde de 2004 tenho servido como pastor na Igreja Presbiteriana em Engenheiro Pedreira (IPEP), onde sigo conduzido esse amado rebanho pela graça de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Sou casado há 22 anos com Alexsandra, minha querida esposa, sou pai de Lisandra e Samantha, preciosas bênçãos de Deus em nossas vidas. Me formei no Seminário Teológico Presbiteriano Ashbel Green Simonton, no Rio de Janeiro, e consegui posteriormente a validação acadêmica pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pela bondade de nosso Senhor, seguimos compartilhando fé, amor e buscando a cada dia crescimento espiritual. Somente Cristo!
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