Lucas 10:39-42. “Tinha ela uma irmã chamada Maria, que se assentou aos pés do Senhor e ficou escutando o que ele dizia. Mas Marta agitava-se com muito serviço. Aproximando-se, perguntou: ‘Senhor, não te importas que minha irmã me deixe sozinha com todo o serviço? Dize-lhe que me ajude!’ Respondeu o Senhor: ‘Marta, Marta, você está preocupada e agitada com muitas coisas; contudo, apenas uma é necessária. Maria escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada.'”
Mateus 6:21-23. “Pois onde estiver o seu tesouro, aí também estará o seu coração. Os olhos são a candeia do corpo. Se os seus olhos forem bons, todo o seu corpo será cheio de luz. Mas se os seus olhos forem maus, todo o seu corpo será cheio de trevas. Portanto, se a luz que está em você são trevas, que tremendas trevas são!”
Encontro com o Salvador
Há apenas dois tipos de pessoas no final: aqueles que dizem a Deus ‘Seja feita a Vossa vontade’ e aqueles a quem Deus diz, no final, ‘Seja feita a tua vontade’. Todos os que estão no Inferno o escolheram. Sem essa escolha própria, não poderia haver Inferno. C.S. Lewis, O Grande Divórcio, p. 75.
Há uma curiosa ironia nos mercados de antiguidades: frequentemente, os objetos mais valiosos jazem cobertos de poeira, ignorados por olhos que não conseguem discernir sua verdadeira natureza. O que parece comum ao transeunte apressado pode revelar-se um tesouro inestimável ao conhecedor paciente. Esta é precisamente a tensão que permeia a narrativa de Betânia, onde duas irmãs enfrentam a mesma presença divina com perspectivas radicalmente distintas.
Aos pés do Salvador
A cena em Betânia apresenta-nos um dilema que transcende culturas e épocas: como responder adequadamente à presença do divino? Maria, assentada aos pés de Jesus, representa mais que uma postura física – ela incorpora uma revolução de prioridades que desafia tanto as convenções sociais de seu tempo quanto as obsessões produtivistas do nosso. “Precioso, Jesus, aos Teus pés aqui estou”, nestas palavras ecoam a descoberta fundamental de Maria: que a proximidade com Cristo não é meio para um fim, mas o próprio fim.
A contemplação não é um luxo espiritual para alguns poucos privilegiados, mas sim uma necessidade vital para todo cristão. É através da contemplação que aprendemos a ver com os olhos de Deus, a pensar com a mente de Cristo e a amar com o coração do Espírito Santo. R.C. Sproul, A Santidade de Deus, p. 189.
Aqueles que se devotam inteiramente a Deus descobrem que Ele é mais do que suficiente para satisfazer todos os seus desejos e necessidades. Eles encontram n’Ele um tesouro inexaurível que supera todos os prazeres e riquezas terrenas. Jonathan Edwards, A Natureza dos Verdadeiros Afetos Religiosos, p. 267.
A tensão entre Martha e Maria não é simplesmente uma questão de temperamentos ou dons espirituais; é uma revelação sobre a natureza do próprio discipulado. Quando a canção declara “Eu encontrei o meu tesouro, eu encontrei o bem mais precioso”, articula-se uma descoberta que Jesus mesmo validou: a “boa parte” não é uma atividade adicional na vida cristã, mas o fundamento sobre o qual toda atividade verdadeiramente cristã deve ser construída. Esta descoberta alinha-se perfeitamente com o ensino de Jesus em Mateus 6:21-23, onde Ele estabelece a conexão indissolúvel entre nosso tesouro e nosso coração, entre nossa visão e nossa iluminação interior.
A expressão que se repete na canção: “Como Maria que estava aos Seus pés” não é mera redundância poética, mas uma afirmação teológica profunda: a posição aos pés de Cristo não é um momento de devoção esporádica, mas uma orientação de vida permanente. Maria não apenas visitou Jesus; ela assumiu a postura do discípulo autêntico. Neste gesto aparentemente simples, ela subverteu expectativas culturais sobre o papel feminino e demonstrou que o Reino de Deus opera segundo uma economia radicalmente diferente – onde o “sentar-se” torna-se mais poderoso que o “fazer”, onde a receptividade supera a atividade frenética.
O tempo gasto na presença de Deus nunca é tempo perdido. É ali que nossa alma é nutrida, nossa perspectiva é corrigida e nossa força é renovada. A contemplação não nos torna menos úteis; ela nos torna mais centrados em Deus e, portanto, mais eficazes em nosso serviço. Martyn Lloyd-Jones, Pregação e Pregadores, p. 198.
A verdadeira espiritualidade não se manifesta na quantidade de atividades religiosas que realizamos, mas na qualidade de nossa comunhão com Deus. É possível estar extremamente ocupado com coisas sagradas e ainda assim estar espiritualmente vazio. A.W. Tozer, A Busca de Deus, p. 87.
Nosso Coração está no Salvador
A “boa parte” que Maria escolheu revela-se não como um prêmio de consolação para os contemplativos, mas como o próprio coração da vida cristã autêntica. Jesus, ao defender a escolha de Maria, não estava menosprezando o serviço de Marta, mas estabelecendo uma hierarquia de valores que perdura através dos séculos: primeiro o ser, depois o fazer; primeiro a comunhão, depois a ação; primeiro o tesouro celestial, depois as preocupações terrenas.
Agostinho, em suas Confissões, capturou esta verdade quando escreveu: “Tu nos fizeste para Ti, e inquieto está o nosso coração, enquanto não repousa em Ti.” A inquietação de Marta era sintoma de um coração que ainda não havia encontrado seu verdadeiro lugar de descanso.
E agora, como viveremos?
Reconheça que vivemos numa cultura que idolatra a produtividade e confunde valor com atividade. A escolha de Maria desafia nossa mentalidade utilitarista, lembrando-nos que nossa identidade não se define pelo que fazemos, mas por quem somos em Cristo. Cultive uma cosmovisão que vê a contemplação não como luxo, mas como necessidade espiritual fundamental.
Examine regularmente onde está seu tesouro. Se nossas afeições estão divididas entre Cristo e mil outras coisas, nosso coração será instável e nossa visão espiritual turva. Permita que o amor por Jesus se torne o filtro através do qual todos os outros amores são refinados e ordenados. Como Maria, descubra que aos pés de Cristo encontramos não apenas orientação, mas satisfação profunda.
Estabeleça ritmos deliberados de contemplação em sua rotina diária. Isso pode significar começar o dia em silêncio diante de Deus antes de consultar o celular, ou criar momentos específicos para simplesmente “estar” na presença divina sem agenda. Resista à tirania do urgente que constantemente ameaça roubar-lhe a “boa parte”. Lembre-se: o que parece improdutivo aos olhos do mundo pode ser precisamente o que sua alma mais necessita.
Oremos
Senhor Jesus, Tu que defendeste a escolha de Maria e declaraste que ela havia escolhido a boa parte, Concede-nos a sabedoria para discernir entre o importante e o essencial, entre o urgente e o eterno. Perdoa-nos pelas vezes em que, como Marta, permitimos que a ansiedade e as preocupações Nos afastem de Tua presença preciosa. Ensina-nos que nosso valor não reside em nossa produtividade, mas em nossa identidade como Teus filhos amados. Que possamos, como Maria, encontrar nosso tesouro em Ti, Reconhecendo que Teu valor supera todo bem terreno. Dá-nos corações contemplativos que Te busquem primeiro, sabendo que todas as outras coisas nos serão acrescentadas. Que Tua Palavra seja mais doce que o mel para nossos corações, E que Tua presença seja o lugar onde nossa alma encontra verdadeiro descanso. Em Teu nome precioso oramos. Amém.
Este devocional se baseia na canção “A Boa Parte” de Canção de Fhop Music e Nívea Soares.
Somente Cristo! Pr. Reginaldo Soares.
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Meu chamado para o ministério pastoral veio em 1994, sendo encaminhado ao conselho da Igreja Presbiteriana (IPB) em Queimados e em seguida ao Presbitério de Queimados (PRQM). Iniciei meus estudos no ano seguinte, concluindo-os em 1999. A ordenação para o ministério pastoral veio em 25 de junho de 2000, quando assumi pastoreio na IPB Inconfidência (2000-2003) e da IPB Austin (2002-2003). Desde de 2004 tenho servido como pastor na Igreja Presbiteriana em Engenheiro Pedreira (IPEP), onde sigo conduzido esse amado rebanho pela graça de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Sou casado há 22 anos com Alexsandra, minha querida esposa, sou pai de Lisandra e Samantha, preciosas bênçãos de Deus em nossas vidas. Me formei no Seminário Teológico Presbiteriano Ashbel Green Simonton, no Rio de Janeiro, e consegui posteriormente a validação acadêmica pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pela bondade de nosso Senhor, seguimos compartilhando fé, amor e buscando a cada dia crescimento espiritual. Somente Cristo!